Em um caso único no país, a eleição pode ainda não ter acabado em Santa Catarina, em especial no município de Içara, no sul do estado. Uma urna eletrônica quebrou na cidade e não foi possível recuperar 287 votos do primeiro turno.
Foi tentado de tudo dentro do previsto na lei eleitoral: transferiram a memória da urna para outras quatro urnas reservas, que não funcionaram. Foi trocada a memória da urna com defeito – não funcionou. O problema fez o fechamento da seção atrasar em duas horas. Aproximadamente 60 eleitores desistiram e foram embora.
Última alternativa: votação com cédula. Outros 43 eleitores votaram e tiveram os votos computados. Mas, como não foi possível recuperar os eletrônicos, a junta responsável pela seção 458 da 79ª Zona Eleitoral anulou os 287 votos anteriores. O episódio provavelmente passaria despercebido se não fosse por um detalhe.
O deputado estadual Dóia Guglielmi (PSDB), natural de Içara, não se reelegeu por apenas 38 votos. A média de votos foram exatos 38 nas outras três seções da escola da urna defeituosa: 32 em uma seção, 40 e 42 nas outras.
Quem acabou eleito pela coligação foi o ex-deputado federal Dr. Vicente (PSDB), que tem base eleitoral no outro extremo do Estado e teve apenas três votos em Içara, onde Guglielmi foi o mais votado, obtendo 4.489 votos, 15% do total da cidade.
Resultado: representando a coligação PSDB-PEN, um advogado indicado pelo derrotado recorreu à Justiça Eleitoral e pediu uma perícia na urna. Se não for possível encontrar os votos perdidos, solicitou de antemão a anulação da eleição naquela seção.
No dia 15 de outubro, a juíza eleitoral Bárbara Thomaselli acatou o pedido e mandou fazer a perícia. “Tudo leva a crer que a contagem de todos os votos modifique sua situação [de Guglielmi]”, escreveu.
Nesta semana, o Tribunal Regional Eleitoral de SC ratificou a decisão e aprovou uma audiência pública para realização da perícia na urna, que desde então está lacrada.
Determinou ainda que técnicos do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) acompanhem a audiência para, se preciso, tentar a última cartada: a decriptografia da urna.
Como o TSE não havia confirmado a participação até quinta (30), a data da audiência continuava em aberto. Enquanto isso, o deputado eleito Dr. Vicente não sabe se prepara a mudança de Jaraguá do Sul para a capital. “É uma situação desconfortável e estranha”, disse ele à Folha, pelo fato de sua própria coligação ter recorrido.
Em nota, o PSDB-SC negou “qualquer atitude para privilegiar um candidato em detrimento de outro”. Disse que irá acatar a decisão judicial. Em uma rede social, um correligionário compartilhou: “Anulação de 287 votos em Içara, baita sacanagem…. tem que ver isso”.
De 8.755 urnas substituídas no Brasil neste pleito, apenas nessa houve esse problema, segundo a Justiça Eleitoral.